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Às vezes é preciso parar
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Às vezes é preciso parar

Actualizado 23/05/2023 07:57
Miguel Nascimento

Andamos em correrias desenfreadas. Em ritmos loucos. Fazemos e continuamos a fazer. Andamos de um lado para o outro apressadamente. Saltamos de uma tarefa para a outra de forma rápida. Temos muita coisa para fazer. Não temos tempo para nada. Sentimos a pressão das horas e dos dias que passam. O calendário avança e as estações mudam o cenário. Mas nós continuamos no mesmo ritmo como se fôssemos ratos dentro de uma roda que pedalamos sem sabermos muito bem porquê e para quê. As tecnologias que incorporamos no processo de fazer não contribuem para abrandar o ritmo ou abrir espaço para o descanso ou lazer. Antes pelo contrário, criam mais pressão e abrem espaço para mais tarefas e compromissos.

Um dia a corda estica demasiado, rebenta! A roda em que nos movimentamos parte uma peça do mecanismo e deixa de funcionar. As circunstâncias forçam uma paragem necessária. Nesse momento, ficamos aturdidos sem saber o que fazer. Depois percebemos que não podemos fazer nada enquanto o mecanismo não for reparado e voltar a funcionar para podermos voltar a correr. É esse o nosso desejo ardente. Desejamos que a roda volte a girar para girarmos com ela apressadamente.

Entretanto, a ansiedade da pausa toma conta nós. Estamos tão acostumados à correria que nos sentirmos perturbados com a quietude. Enquanto o mecanismo é reparado o tempo que agora segue mais devagar vai-se impondo em nós. Necessariamente vamos, fora do bulício habitual, escutando as batidos do nosso coração que agradece a pausa. O nosso olhar que seguia focado na frente prende-se agora em todas as geografias que pode alcançar, deleitando -se com as cores que antes não via.

As nossas mãos, libertas de volantes e teclas, podem agora tocar na doce textura do chão e na água fresca e cristalina que corre livre pelo vale. O sol ilumina agora o caminho que não temos pressa em percorrer. O momento de pausa empurra-nos para novas descobertas que se fazem devagar. A pressa ficou arrumada na gaveta das urgências que afinal não eram assim tão urgentes. Aprendemos a apreciar o momento, alargando o espaço das conversas intermináveis, com beijos e abraços a perder de vista no horizonte que agora é nosso.

Os afectos dominam a paisagem que era povoada por correrias desenfreadas. Não sei quanto tempo passou enquanto o mecanismo da roda foi reparado. Está tudo pronto, dizem. Tenho que ir outra vez. Mas vou devagar e com pausas marcadas. Agora sei que não é por muito correr que amanhece mais depressa. Sim, às vezes é preciso parar para pensar, viver e amar.

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