"Quem encontra prazer na solidão, ou é fera selvagem ou é Deus." Aristóteles
Já escrevi sobre a solidão que mata. Sobre a solidão que provoca dor e sofrimento. Só escrevo o que sinto. Só escrevo o que o meu coração manda escrever. Às vezes escrevo o que o vento me sussurra. Por isso e por muitas outras razões, inspiro-me em Sophia de Mello Brayner Andresen para também manifestar através das palavras que: "vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar." Mas hoje, neste domingo, quero comungar convosco do prazer da solidão. Sim, a solidão mata! Mas há uma solidão que dá prazer! É sobre essa solidão que dá prazer que hoje é pão e alimento destas palavras juntas. Aristóteles dizia que "quem encontra prazer na solidão, ou é fera selvagem ou é Deus". Naturalmente, somos feitos de gente. Precisamos uns dos outros. Precisamos dos outros para darmos sentido à vida e para caminharmos juntos até ao nosso destino. Precisamos dos outros e outros precisam de nós para nos construirmos, no conjunto e individualmente. Mas, nesta viagem, também precisamos de estar a sós, connosco, com as nossas dúvidas e incertezas. Com as nossas inquietações! Precisamos de tempo para pensar nas coisas, para construirmos a nossa individualidade e, no fundo, para sermos nós, antes e depois dos outros. No contexto da solidão consentida e até provocada, somos mais autênticos e, provavelmente, mais felizes, na medida em que nos libertamos de todas as máscaras, nos despimos de todos os preconceitos e, acima de tudo, cortamos as amarras em relação ao cais que nos prende à terra. Precisamos de mar, de água, vento, e de todas as palavras que nos libertem para crescermos na nossa singularidade. Depois disso, desse tempo nosso, podemos dar-nos aos outros e recebermos tudo o que temos a receber. O tempo da nossa solidão é também o tempo da nossa liberdade. O nosso tempo de quietude e isolamento é referência e geografia da construção da nossa identidade que nunca ficará completa sem os outros, os que nos abraçam e os que nos atiram pedras. Nós somos o resultado da nossa solidão e do nosso confronto com os outros. No lugar da absoluta singularidade não temos filtros. Apresentamo-nos na nossa nudez diante do espelho. Contemplamos a nossa pela leve e jovem ou a profundidade das nossas rugas. Isso não importa para o caso em apreço. Estamos ali, despidos de roupagens e de preconceitos, a olhar para a nossa imagem reflectida no espelho. Aí, nesse espaço acolhedor, familiar e, ao mesmo tempo, bruto e rude, temos que nos confrontar connosco para crescermos. Nessa esfera limite da intimidade em que nos encontramos connosco extraímos um prazer imenso da solidão. Percebemos que é a seiva que nos alimenta e a luz que nos clareia o caminho. Às vezes, quando a multidão nos sufoca, por tudo e nada, devemos descer ao nível da nossa maior solidão para respirarmos um pouco, para nos percebermos melhor e para nos encontramos connosco. O encontro com a solidão é um prazer incomensurável. Não sei, como dizia Aristóteles, se reencarnamos o espírito da fera ou nos sentimos deuses de uma causa maior que paira sobre todos os outros. Espreito as referências mas recuso catalogações. Cada um de nós tem uma relação especial com o seu denominador comum da intimidade. Às vezes não é fácil provocarmos a solidão. Mas quando isso acontece, sentimos sempre o prazer de voarmos ao encontro da nossa verdadeira essência e também da razão da nossa caminhada. Às vezes, quando nada faz sentido é, precisamente, na solidão da nossa intimidade que encontramos o tom para não desafinarmos no resto da canção. As palavras do silêncio são nossas. Cravam-se na nossa pele e despem-nos de tudo. Ali, naquela nudez feita simplicidade, somos nós, apenas nós, para nos construirmos para os outros. E isso confere um enorme poder à solidão e também um prazer extraordinário.
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