" Ah, que ninguém me dê piedosas intenções, Ninguém me peça definições! Ninguém me diga: "vem por aqui"! A minha vida é um vendaval que se soltou, É uma onda que se alevantou, É um átomo a mais que se animou? Não sei por onde vou, Não sei para onde
Inspiro-me em Sophia de Mello Breyner Andresen, em particular na sua poderosa poesia Cantata da Paz: "vemos, ouvimos e lemos / Não podemos ignorar". Hoje, a comunicação social amplifica os acontecimentos do mundo, globaliza-os. Geografias distantes e latitudes imensas são aproximadas aos nossos sentidos através da extraordinária força da imagem e das plataformas multimédia. Pierre Nora, o historiador francês e filósofo da identidade e da memória disse em tempos que "só acontece o que é notícia"! Sempre concordei com ele. A comunicação social tem essa grande magia de fazer acontecer as coisas diante dos nossos olhos. Uma atrocidade cometida contra os direitos humanos num espaço isolado ou numa geografia distante no nosso planeta podia nunca existir na medida em que, por exemplo, um massacre de vidas humanas não era do conhecimento da comunidade desta imensa aldeia global. Ou seja, apesar de muitos seres humanos terem perecido às mãos de assassinos, violadores e torturadores, este facto era como se não tivesse acontecido na medida em que não tinha sido notícia! Mas, a verdade é que seres humanos tinham sido, mortos, violados e torturados num determinado tempo e num determinado lugar! Ao longo da história foram cometidas muitas atrocidades contra homens, mulheres e crianças a coberto deste manto invisível e protector da cobardia e da malvadez. A aldeia global veio mudar o panorama e recentrar as coisas na notícia! Por isso, as imagens constantes que chegam até nós sobre o "drama das migrações" fazem com que o nosso coração não possa ficar indiferente. As imagens têm uma força extraordinária e fazem acontecer as coisas mais depressa. Criam uma pressão mediática que obriga os políticos a tomarem as decisões necessárias que, de outra forma, não tomariam ou eventualmente arrastariam os processos decisórios em reuniões burocráticas intermináveis, mas sempre acompanhadas pelas respectivas conferências de imprensa de lamento e solidariedade perante este drama humano que se vive às portas da Europa. A comunicação social está de parabéns porque está a cumprir a sua verdadeira missão de informar. Assim, vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar! Esta crise das "migrações" não é um problema da Europa. É um problema do mundo! Mas, é às portas da Europa que milhares de seres humanos vêm pedir auxílio fugindo da morte, da pobreza e do caos! A Europa é um porto de abrigo e um foral de uma imensa luz humanista. A questão não é de fácil resolução como não é a da crise das dívidas soberanas dos seus estados-membros. A economia e a crise das migrações são dois grandes desafios que a Europa tem pela frente. Por isso, deve estar à altura das circunstâncias e fazer um enorme esforço solidário para os resolver. Caso contrário temo pelo futuro da Europa tal como a conhecemos, nomeadamente a zona comum fundada sobre os escombros da guerra para construir os caminhos da paz. Este não é o tempo da politiquice europeia e dos braços-de-ferro entre eixos e blocos de interesses. Este é o tempo do regresso aos valores humanistas e à defesa intransigente dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade que nos inspiraram a todos na construção de um mundo novo, mais justo, coeso e solidário! Mas, para que tal aconteça a Europa tem que encontrar um rumo, um caminho, deixando de andar á deriva. Olhando para o actual estado do espaço europeu que sofre as contingências dos apelos políticos do "vem por aqui" ou " vem por ali" recordo José Régio e o seu "Cântico Negro":
"(?) Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou?
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!"
La empresa Diario de Salamanca S.L, No nos hacemos responsables de ninguna de las informaciones, opiniones y conceptos que se emitan o publiquen, por los columnistas que en su sección de opinión realizan su intervención, así como de la imagen que los mismos envían.
Serán única y exclusivamente responsable el columnista que haga uso de nuestros servicios y enlaces.
La publicación por SALAMANCARTVALDIA de los artículos de opinión no implica la existencia de relación alguna entre nuestra empresa y columnista, como tampoco la aceptación y aprobación por nuestra parte de los contenidos, siendo su el interviniente el único responsable de los mismos.
En este sentido, si tiene conocimiento efectivo de la ilicitud de las opiniones o imágenes utilizadas por alguno de ellos, agradeceremos que nos lo comunique inmediatamente para que procedamos a deshabilitar el enlace de acceso a la misma.