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Macchina del fango
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Macchina del fango

Actualizado 03/05/2015
Miguel Nascimiento

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Umberto Eco, um dos maiores pensadores do nosso tempo, referiu-se, há dias, numa entrevista a um jornal de grande expressão em Portugal, à "macchina del fango" (máquina de lama), como uma forma de lançar sombras e suspeições sobre pessoas com intuitos pouco claros. Partindo desta ideia referida por Umberto Eco, imediatamente identificamos, para além da geografia italiana, muitas situações - nomeadamente no palco político ? que, com base em meias-verdades, insinuações e cenários fantasiosos, fazem surgir notícias que afectam a imagem deste ou daquele político. A relação dos políticos como os cidadãos eleitores não é, como sabemos, muito famosa.

Os políticos são cada vez menos reconhecidos e o exercício da actividade política tem vindo a perder prestígio. Há um enorme "desencanto ciudadano" como tem vindo a referir a investigadora de ciência política Yanina Welp. São muitos os factores que contribuem para a existência desta relação fria que, por sua vez, tem levado à criação de um fosso cada vez maior entre os cidadãos e os seus representantes democraticamente eleitos.

O sistema político tem vindo a perder força, não apenas pela diminuição da participação dos cidadãos nos sucessivos actos eleitorais mas, essencialmente, pelo descrédito que os própios políticos têm vindo a semear junto das comunidades que representam. Para muitos, a "luta" política é o exercício do "vale tudo". É nesta voracidade pelo poder e nesta cegueira que se apodera de muitos dos que chegam aos cargos de decisão e também dos que os querem apear que a "macchina del fango" encontra terreno fértil para enlamear tudo e todos. Com imagens manchadas e algumas vidas desfeitas pela "lama" atirada uns cantarão vitórias efémeras enquanto outros irão "lamber as feridas" das derrotas momentâneas jurando, em simultâneo, a vingança que será servida fria e, provavelmente, com recurso à mesma "máquina de lama" que agora lhes induziu tantos estragos. Na arena política o sangue está sempre a correr! É um autêntico sobe e desce de uma espécie de "castas" políticas que estão em guerra permanente pela conquista do poder.

Uns e outros não percebem que enquanto continuarem dinamizar esta máquina, enlamenando-se constantemente, vão diminuindo o seu espaço de intervenção, o seu prestígio, a sua honra e dignidade e, naturalmente, o seu poder! Os cidadãos estão atentos. Agora mais do que nunca! Exigem soluções para os seus problemas e estão pouco disponíveis para pagar bilhete para assistirem a espectáculos degradantes numa arena que tem sempre uma imagem de grande destruição, dor e sofrimento. Há dias, um jovem autarca dizia-me que tem vindo a desencantar-se com algumas práticas políticas na medida em que estão mais vocacionadas para o exercício do poder pelo poder e menos atentas às reais necessidades das populações. Essa é uma das razões que tem vindo a provocar o desencanto dos cidadãos em relação à política e aos políticos. A política é um exercício de grande relevância que exige sacríficios pessoais, sentido de serviço público e visão estratégica. Mas, a política também é feita por homens e mulheres, com defeitos e virtudes.

Nem todos estão à altura do cargo para que foram eleitos apesar de se encontrarem verdadeiramente legitimados pelo voto popular. Por outro lado, grandes conquistas civilizacionais e extraordinários empreendimentos de natureza diversa foram realizados por políticos com enorme sabedoria e visão estratégica. A história da democracia está repleta de fracassos e sucessos. De homens fracos e de virtuosas lideranças. Na verdade, como disse Winston Churchill a "democracia é o pior de todos os sistemas à excepção de todos outros". Por isso, o caminho deverá ser sempre o do aperfeiçoamento da democracia e da rejeição enérgica de outros sistemas que, entre outras razões, aproveitaram todas as brechas para instalarem as suas ditaduras! Por isso, neste tempo de grandes transformações sociais é fundamental que os políticos façam um enorme esforço para melhorarem a sua atitude começando pela destruição das "máquinas de lama" e pela promoção do debate de ideias e projectos em detrimento da intriga palaciana e do ataque pessoal. Este é tempo do reforço da democracia representantiva e também do aumento do estímulo da cidadania em todas as formas de participação democrática. Sem participação a democracia debilita-se.

De resto, um dos grandes desafios dos novos tempos democráticos é, precisamente, a introdução de novas formas de participação política que permitam que os cidadãos tenham um controlo maior sobre a actuação dos poderes públicos. Ainda estamos a tempo de inverter o sentido da degradação (que infelizmente temos vindo a assistir) da política, dos políticos e do próprio sistema representativo. Não conseguiremos certamente resolver as coisas de um dia para o outro. Mas podemos começar por destruir as "máquinas de lama", levar o combate político para o domínio da argumentação à volta de ideias e projectos estimulando, ao mesmo tempo, a participação dos cidadãos nos processos de decisão. Estamos sempre a tempo de mudar!

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