OPINIóN
Actualizado 14/09/2025 08:50:47
Miguel Nascimento

Há dias os meus caminhos cruzaram-se com esta frase que, para mim, é muito impactante: “A ponte mais difícil de atravessar é aquela que separa as palavras das atitudes.” Não conheço a sua origem ou autoria. Apenas posso constatar a verdade que ela encerra e o efeito que ela tem ou deve ter em todos os que caminham e atravessam pontes. Na verdade, já todos fomos objecto de promessas férreas, feitas de palavras doces e repletas de esperança que, em concreto, não encontraram correspondência na prática. Ou seja, já todos fomos enganados e ludibriados. Já todos nós deixámos levar por palavras de encanto que o vento levou sem piedade.A palavra tem um poder imenso. Pode mover montanhas e arrastar almas para todas as geografias. Mas esse poder tem que ser respeitado e não banalizado ou maltratado. O que se promete deve ser cumprido, justamente para honrarmos a palavra, o seu poder e a sua consistência. Quando não cumprimos o que prometemos estamos a defraudar-nos e a defraudar os outros. Cumprir exige foco, disciplina, empenho e determinação. Por isso, não devemos enfraquecer o poder da palavra, prometendo o que sabemos não poder cumprir. A ponte que queremos atravessar entre a palavra e a atitude será tão leve quanto a firmeza do nosso carácter. Se formos honestos connosco e com os outros sabemos que a palavra proferida tem peso. Sabemos que a devemos honrar, cuidar e prestigiar. Se assim não fizermos a palavra vai deixando de ter valor e nós também. Nos tempos que correm, demasiado gelatinosos, a palavra perde-se no meio dos muitos interesses em jogo. Há demasiados avarentos que dizem e fazem justamente o seu contrário. É pena. A humanidade também se vai perdendo nesta contabilidade quase infinita de perda de importância da palavra e de definhamento do carácter. Os valores humanistas, pilares fundamentais das nossas comunidades, vão-se transformando em pó. Não precisamos de colocar dogmaticamente a moral e os bons costumes no topo das nossas prioridades. Não devemos exagerar nos caminhos seguros das verdade insofismáveis. Mas podemos e devemos ser mais humanos, convivendo tranquilamente com as nossas imperfeições. Isso significa que devemos ser inteiros e colocar o coração em tudo o que fazemos. Honrar a palavra é uma delas. Fazê-la corresponder às atitudes é outra. Se assim fizermos a ponte que queremos atravessar terá sempre passagem fácil e livre. Se assim fizermos, estaremos a regar a humanidade para que a esperança seja sempre verde e luminosa.

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