OPINIóN
Actualizado 16/11/2024 09:09:32
Miguel Nascimento

No nosso comunitário modo de vida sabemos que precisamos de “construir pontes” em acto contínuo. Como não desejamos estar isolados, construímos pontes que nos liguem aos outros, estabelecendo laços de confiança ou elos de fraternidade para que o tempo comum possa fluir em harmonia. Quando procuramos diálogo e interacções positivas construímos pontes.

Quando queremos o contrário erguemos muros. A este propósito Isaac Newton terá proferido (séc.s XVII/XVIII) a seguinte frase: “construímos muros demais e pontes de menos”. Hoje, no tempo presente, esta proclamação, para além da sua enorme actualidade, assume particular relevância na medida em que se continuam a construir muros em vez de pontes que estabeleçam os diálogos necessários, evitando mais conflitos e rios de sangue que continuam a engrossar pelo mundo fora.

Não é por acaso que um dos grandes pensadores da modernidade, Zygmunt Bauman, reforce, insistentemente, esta ideia nas suas múltiplas intervenções. As pontes ligam margens, encurtam distâncias, contornam obstáculos e, sobretudo, unem as pessoas. Por oposição, os muros fecham portas e reforçam as posturas dogmáticas, cegas e carregadas de ódio.

A humanidade conseguiu derrubar muros mas parece não ter aprendido a lição, uma vez que continua a permitir que a loucura de alguns continue em frente, permitindo-lhes a construção de muros de vergonha que desenham paisagens de medo e escuridão em diversas geografias. Mas há outros muros e outras pontes. Há muros que são construídos para defesa pessoal, sobretudo pelas pessoas que já sofreram muito ou foram muito magoadas. Os muros protegem e impedem novos sofrimentos, mas também novas aprendizagens.

Par que a evolução do ser humano aconteça, precisa que estejamos em contacto com todas as sensações e emoções que o mundo nos pode transmitir. Neste quadro, os muros funcionam como armaduras que protegem mas que ao mesmo tempo pesam, atrasando a caminhada. Não deixam que a nossa pele entre em contacto com o ambiente que nos envolve. A armadura não deixa respirar… e pesa.

Pesa muito, apesar de proteger. É sempre mais fácil construirmos muros ou envergarmos armaduras para nos protegermos dos outros e das dores que nos provocam do que construirmos caminhos tão livres quanto expostos. Mas com tanto peso armado também nos matamos aos poucos, deixando de respirar e de avançar. Se quisermos avançar temos que deixar de construir muros e armaduras, mesmo que isso nos torne mais vulneráveis. A vida também é isso. É estarmos em contacto com tudo o que nos rodeia, mesmo estando sujeitos a uma maior vulnerabilidade. Só assim aprendemos. É assim que ganhamos o nosso coração e o dos outros.

Por outro lado, também devemos deixar de construir pontes; ou melhor, temos que as desconstruir. E se necessário, derrubá-las depois de as atravessarmos, justamente para não voltarmos para trás. O imperador Júlio César e muitos generais ao longo dos tempos da história mandaram destruir as pontes que atravessaram para galvanizar as suas tropas ao mesmo tempo que as colocavam perante a opção de vencer ou morrer! Quando lutamos pela nossa vida precisamos de reunir o melhor de nós, concentrando-nos na nossa sobrevivência. Devemos fazer o mesmo no caminho, mesmo que a nossa vida não esteja em risco.

As pontes que atravessamos devem ser destruídas para que não possamos voltar para trás. Hesitamos muito. Gostamos do conforto do recuo e das saídas de emergência. Mas há alturas na nossa vida em só podemos avançar se quisermos vencer. E vencer não se aplica só a batalhas épicas. Aplica-se a tudo no caminho. Avancemos, destruindo pontes e deixando de erguer muros. Sejamos nós por inteiro! Sejamos felizes mesmo no meio de todas as contrariedades.

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