OPINIóN
Actualizado 27/10/2019
Miguel Nascimento

"Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos." Antoine de Saint-Exupéry

Olhamos vezes sem conta, para dentro e para fora. Olhamos mas não vemos. Não vemos as pequenas coisas. Os detalhes. As diferenças que importam. Não vemos com profundidade porque estamos sempre cheios de pressa. Não nos perdemos no olhar para seguirmos a linha que nos coloca na direcção do outro, apenas para percebermos se está bem, se precisa de alguma coisa, se, no fundo, precisa de nós. Não nos damos a esse trabalho apesar da aparente simplicidade da tarefa. Os olhos são o espelho da alma. E tantas vezes não olhamos nos olhos porque não queremos olhar para não sentir. Não queremos perceber nada porque vamos cheios de coisas para fazer e não podemos perder tempo. As emoções atrasam-nos. Não nos deixam chegar mais à frente. Imobilizam-nos! Fazem-nos pensar, rir e chorar tantas vezes. Quando, verdadeiramente, olhamos nos olhos não podemos contabilizar o tempo que os ponteiros do relógio marcam. Temos que nos saber perder pelo olhar adentro. Temos que saber ver com o coração. Antoine de Saint-Exupéry disse-nos, a este propósito, que só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos." A essência das coisas é difícil de alcançar. Está para além do olhar. Está ao alcance de quem sabe ver com o coração. E o coração não tem pressa. Gosta de gostar. Gosta de saborear a emoção que corre ao sabor da liberdade que nos toca. Os que têm a sorte de saber ver com o coração fazem do caminho uma festa. Quando percorrem a estrada vão libertando o perfume das memórias e enchendo todos os espaços de luz. Sabem que as pequenas coisas contam mais do que todas as grandiosidades desenhadas no firmamento. Sabem que os pequenos momentos contam. Sabem que as palavras sussurradas ao ouvido são mais do que melodias, são hinos à simplicidade e ao amor. Quem olha com o coração não precisa de encenações, de adornos, nem de puxar brilho aos metais. Precisa apenas de se deixar deslizar pela simplicidade das coisas que verdadeiramente importam. E o que importa nem sempre está ao alcance de um olhar. O que importa só pode ser alcançado com o coração que, por vezes também não vê, mas sente primeiro o que vê depois. A superficialidade com que vivemos nestes tempos constrói, todos os dias, zonas de nevoeiro que turvam a visão e o coração. Adensamo-nos em todas as futilidades ao mesmo tempo que nos afastamos de todas as coisas que verdadeiramente importam. A simplicidade é o caminho. O coração é o olhar que vê o que interessa, sem fantasias e dissimulações. Olhar com o coração é sentir a verdade das coisas e experimentar a nudez de tudo. Não há olhar como esse. Não há tempo tão verdadeiro. Não há vida tão cheia como essa!

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