OPINIóN
Actualizado 30/06/2019
Miguel Nascimento

Por estes dias e em forte convívio ibérico escutei uma frase maravilhosa: os caminhos de fronteira são corredores culturais por onde passaram muitas civilizações ao longo dos séculos! Se todos os que ainda povoam esta geografia fronteiriça se agarrassem a esta frase como um farol, o caminho do futuro teria, certamente, mais luz e mais resultados. Na verdade, a fronteira está aí, separa dois países no quadro das suas soberanias. Mas essa linha que separa e identifica dois lados deixou de ser uma barreira na década de noventa do séc. XX quando, em verdadeiro processo de construção europeia, abriu as suas portas à livre circulação e pessoas e bens. Há muito que somos livres de passar de um lado para o outro. Mas não o fazemos com a intensidade que devíamos para enorme prejuízo de Portugal e Espanha porque, infelizmente, ainda existem muitas barreiras psicológicas que precisamos romper. As civilizações ancestrais atravessaram as fronteiras por necessidade ou estratégia, quase sempre de natureza militar. Num tempo ainda recente as barreiras fronteiriças magnetizavam a actividade do contrabando para que muitos, colocando a vida em risco, pudessem colocar pão na mesa e alimentar os seus filhos. Muitas gerações de portugueses passaram a fronteira com Espanha e depois para França para ganharem o futuro que o seu chão lhes negava. A fronteira e os seus caminhos estão sob a nossa pele. Mas, por vezes, esquecemo-nos de olhar para a história e resistimos, no nosso canto, ao permanente desafio do conhecimento de tudo o que está do outro lado e muito para além do nosso horizonte visual. Uns dizem que a questão da língua é uma barreira. Outros insistem nas diferenças culturais e na distinta organização funcional dos dois estados como autênticos muros difíceis de transpor. Por estes dias convivi com portugueses e espanhóis unidos pela cultura desenhando futuros imediatos e longínquos sem pensarem um segundo que fosse nas fronteiras que não existem. Por estes dias os caminhos de fronteira voltaram a ser lugares de esperança e de encontro de vontades. Sim, quem tem vontade de fazer tudo pode. E se estivermos juntos, partilhando as nossas dificuldades, mas sempre a espeitar as oportunidades que se alargam em conjunto, será possível desenharmos um território mais partilhado e colaborativo. Se nós quisermos as diferenças serão fermento para ligar a massa do pão do caminho. Se nós quisermos podemos reforçar a coesão de um território acabando de vez com as descontinuidades, reforçando a questão cultural como ponte de ligação e religação das pessoas e das suas respectivas comunidades. Se nós quisermos os caminhos de fronteira serão sempre caminhos de esperança e geografias de todos os afectos.

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