OPINIóN
Actualizado 27/01/2019
Miguel Nascimento

"Cada vez somos más frágiles, cómplices del aturdimiento que nos imponen las convenciones sociales, supuestas normas que nos protegen y vigilan amparadas por cualquier comunidad política e ideológica. Creemos ser protagonistas de una historia ávida en des

Mateo Feijóo, director artístico das Naves Matadero - Centro Internacional de Artes Vivas (Madrid), diz-nos na introdução do catálogo do programa que coloca à disposição do público que "cada vez somos más frágiles, cómplices del aturdimiento que nos imponen las convenciones sociales, supuestas normas que nos protegen y vigilan amparadas por cualquier comunidad política e ideológica. Creemos ser protagonistas de una historia ávida en deseos inútiles (?)". O texto continua assim, livre e solto. Não tem vírgulas nem pontos finais. Corre como um rio sem se saber se vai desaguar ao mar. Parece uma escrita de Saramago. Assumo que coloquei a pontuação na frase que aqui cito. Assumo também essa minha liberdade de colocar pontuação nas palavras que escolho para integrar a minha criação. Leio o texto de Mateo Feijóo uma e outra vez. Peço-lhe desculpa por ter colocado pontuação em palavras que talvez ele pretendesse soltas e livres de qualquer convecção ortográfica ou outra. Concordo com ele. Sim, somos cada vez mais frágeis na medida em que nos diminuímos. Submetemo-nos a todas as regras possíveis e imaginárias. Deixamo-nos levar, cada vez mais, por linhas ideológicas, políticas (e outras) cada vez mais extremadas. Deixámo-nos encurralar em barreiras que diminuem o encanto da vida e o espaço de toda a criação. Vamos perdendo a nossa liberdade que foi conquistada a pulso. A nossa fragilidade é alimentada por nós. Cumprimos rotinas. Não queremos sair do carreiro. Vamos em frente com palas nos olhos para não contemplarmos o que está à nossa volta. Mantemos uma atitude pessimista seguindo no caminho certo sob os auspícios de todas as regras e convenções. Seguimos demasiado alinhados e com uma enorme infelicidade estampada no rosto. Quanto nos atrevemos a olhar para além das palas que temos olhos observamos a arte a sufocar apenas porque não a alimentamos e não cuidamos dela. Ela vai morrendo aos poucos, como a nossa humanidade. Se não sairmos desta zona escura, desta cegueira, caminharemos para o abismo. Para um ponto de não retorno. Seremos cúmplices do nosso fracasso colectivo. Vivemos cada vez mais num espaço virtual que estimula a nossa fragilidade. Não tocamos nas coisas. Não nos deixamos levar pela emoção. Não deixamos que a criação volte a depositar a emoção no nosso coração. Estamos perdidos e sem rumo. Vivemos debaixo de um sol que não nos aquece e que não nos dá luz suficiente. Temos medo de apostar nas coisas sem regras e nos espaços de todas as liberdades criativas. Recusamos desafios. Seguimos no carreiro das coisas que vão certas e que cumprem todas as normas. Fazemos quase todos o mesmo. Repetimos gestos como se fossem parte de um ritual sem emoção e sem sentido. Vamos sem olhar para os lados. Sem questionarmos. Se nos interrogarmos até sobre o próprio destino da nossa viagem. Vivemos numa escuridão completa. Estamos cada vez mais frágeis como diz Mateo Feijóo. Precisamos de acordar desta letargia e deixar que o sol nos volte a aquecer. É tempo de ganharmos espaço para a nossa liberdade deixando que a criação artística e todas as formas de arte nos tornem mais fortes, mais humanos. Este é o tempo de nos começarmos a reerguer das cinzas para construirmos, com as nossas mão, um mundo de poesia, com cores múltiplas e sonoridades absolutamente livres. Este é o tempo de nos despirmos das convenções que nos amarram à hipocrisia como se ela fosse uma bússola a indicar o caminho. Este é o tempo de nos importarmos com as coisas que acontecem e não de nos desligarmos de tudo para vermos se a tempestade passa. Nesta viagem em direcção ao futuro temos que voltar a amassar o barro e a pintar as nossas caras com as cores que a floresta nos dá para dançarmos ao som da nossa finita humanidade. Talvez assim possamos um dia não sentir vergonha do caminho que estamos a trilhar.

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