OPINIóN
Actualizado 14/10/2018
Miguel Nascimento

"Na realidade, não se trata apenas de saber que mundo queremos deixar aos nossos filhos, mas também de que filhos deixaremos ao mundo". Corine Pelluchon

Quem estiver atento ao que se passa no mundo percebe, com facilidade, que nos encontramos num caminho que nos afasta do humanismo. E isso terá consequências muito graves a curto prazo e efeitos devastadores a médio e longo prazo! A sociedade estimula, cada vez mais, a nossa perspectiva individualista e empurra-nos para a construção de muros em vez de pontes. A comunicação social invade a nossa intimidade até à exaustão com imagens de morte e de miséria, a tal ponto que semeia a indiferença sobre o que acontece para lá da soleira da nossa porta. Não queremos saber. Vemos e escutamos mas não queremos saber. Apenas queremos saber de nós e das nossas questões. O diálogo, o debate de ideias, o raciocínio lógico e ponderando, a argumentação e o confronto democrático estão a esvair-se em sangue e na falta de esperança. Ganham destaque e alcance as posições extremadas, as políticas fora da caixa e os sound bites que estimulam ódios, o racismo e a xenofobia. Ressuscitam-se velhos fantasmas do passado. Ignoram-se as lições que a humanidade sofreu na pele às mãos dos ditadores e dos seus regimes totalitários. O politicamente correcto foi banido das ágoras e das dialécticas. A diplomacia foi substituída pela ameaça e pela marcação de terreno. Assumem-se posições musculadas que arrumam a um canto todos os esforços de concertação. A democracia começa a enfraquecer-se em muitas geografias. Os extremos começam a encontrar terreno fértil para galoparem nas sondagens e sobretudo nos resultados. O horizonte avizinha-se negro. O mundo transforma-se a um ritmo alucinante. Sempre para pior. Perdem-se os valores e as referências. A luz perde intensidade e o caminho torna-se mais escuro, menos visível. Estamos no meio de uma grande emergência! Precisamos de convocar o humanismo, já! Precisamos de inventar novos caminhos para sairmos da passividade! Precisamos de respostas com dimensão humana para resolvermos a crise dos refugiados! Temos de combater a indiferença que mata e que nos mata! Os migrantes que fogem da guerra, da fome e da humilhação encontram a morte, a fome e a humilhação às portas da Europa, na geografia da esperança e onde pontificam as democracias mais antigas do mundo. Mulheres e homens, crianças, jovens e menos jovens, velhos e todos os nossos semelhantes pedem-nos que os ajudemos nesta grande cruzada pela vida e pela salvação da humanidade. Muitas vezes damos-lhe pão e agasalho. Outras vezes nem lhes abrimos a porta! E, sobretudo, não estamos disponíveis para resolvermos o problema na sua base estrutural! Este é um dos maiores desafios da nossa contemporaneidade. É um desafio para todos os limites da dignidade humana. É um espelho no qual todos temos que nos rever para verdadeiramente avaliarmos a nossa condição humana, pesando sempre na mensagem forte que nos passou Hannah Arendt. Este é o tempo de fazermos pela humanidade. De lutarmos por ela! Precisamos de reafirmar o humanismo, ajudando o próximo para, entre outros, salvarmos a democracia e o nosso coração! Como disse Corine Pelluchon, "na realidade, não se trata apenas de saber que mundo queremos deixar aos nossos filhos, mas também de que filhos deixaremos ao mundo". E esse mundo novo está intimamente conectado com a nossa condição humana. Este é um tempo para reflectir e agir. Este é um tempo para convocarmos o humanismo, já!

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