Enquanto houver um louco, um poeta e um amante haverá sonho, amor e fantasia. E enquanto houver sonho, amor e fantasia, haverá esperança. " William Shakespeare
A vida às vezes é dura. Prega-nos partidas. Rasteira-nos. Temos que saber viver com isso. Ultrapassar obstáculos. Temos que cair para nos levantarmos as vezes que forem necessárias. Essa é a nossa realidade. Mas nós somos de carne e osso. Somos a expressão das nossas emoções, dos nossos afectos, dos nossos sentimentos. Não somos de ferro! Não somos indestrutíveis! Sofremos os embates da realidade que, por vezes, é tão dura e tão cruel. As marcas das coisas menos boas ficam sempre em nós. Colam-se à nossa pele. Não saem com o sopro de qualquer brisa de felicidade momentânea. Elas ficam lá para nos lembrarem sempre que a vida é dura e que a realidade existe de forma implacável. E essa realidade toca-nos. Magoa-nos. Mas temos que seguir em frente! Há um caminho a percorrer! Há tantas montanhas para subir e outras tantas para descer. Às vezes precisamos de um refúgio e de desenhar uma realidade mais doce e feliz, ainda que o desenho não passe da nossa cabeça para o papel para ganhar a vida que merece. A fantasia faz parte de nós e está presente no nosso caminho. Precisamos dela para intercalarmos a vida e para tornarmos a caminhada mais doce e suave. Também por isso gostamos tanto de sonhar acordados e de contemplar as estrelas do céu onde fazemos castelos de luz e de prazer sem fim. A imaginação está ao nosso alcance. A realidade bate-nos à porta a todo o instante. Por vezes, precisamos de uma pausa, de um momento para recuperarmos o fôlego e seguirmos em frente. Precisamos de, momentaneamente, inverter os papéis e deixar que a fantasia tome conta da realidade e a pinte das cores mais alegres que puder. Por isso, e como nos diz o criativo Gutto Carrer Lima, precisamos de nos desconstruir e "variar entre a fantasia e a realidade, sem me desfazer. Reconstruir-me sem me demolir." Sim, esse é o segredo desta aparente metamorfose onde reside a nossa capacidade de transformarmos a fantasia em realidade para ganharmos mais tempo ao futuro. De resto, como disse William Shakespeare, "enquanto houver um louco, um poeta e um amante haverá sonho, amor e fantasia. E enquanto houver sonho, amor e fantasia, haverá esperança." É essa esperança que reclamo e que quero semear enquanto percorro o caminho, tornando-o mais leve e luminoso. Quero continuar assim mas tendo presente o sábio conselho de Walt Disney: "quando fazemos fantasia não podemos perder de vista a realidade." Se assim acontecesse poderíamos cair no buraco negro em que muitos infelizmente cairam e onde o tempo deixou de fazer sentido. Aí nada é claro. Tudo é turvo e a fantasia e a relidade andam de braço dado pela avenida que vai dar a um beco sem saída. Precisamos de ter cuidado embora, por vezes, a linha seja demasiado ténue. A fronteira entre a fantasia e a realidade é muito estreita e nem sempre vemos as coisas como elas devem ser vistas na medida em que na palavra de Lloyd Alexander "a fantasia não é exactamente uma fuga da realidade. É um modo de a entender". E o melhor tratado de fantasia e realidade que conheço é o D. Quixote de la Mancha, o cavaleiro da triste figura, uma magistral criação de Miguel de Cervantes. Todos combatemos contra os nossos moínhos de vento e vemos exércitos inimigos nas poeiras que se levantam no horizonte. Mas, a realidade puxa-nos sempre o tapete, interrompendo o nosso sonho e a nossa fantasia. O fiel escudeiro, Sancho Pancha, apresenta-se de forma simples e humilde, mas é o grande mensageiro da realidade. A história conta-nos que perante a soberba representação do cavaleiro que queria mudar o mundo existiu (e presume-se que existirá sempre) um Sancho Pança para estragar a festa. Aliás, como disse Kafka "a grande desgraça de D. Quixote não foi a sua fantasia mas sim Sancho Pança." Todos devemos ter a dose certa de loucura e de amor para fantasiarmos o tempo da nossa vida que for necessário para nunca perdermos a esperança.