Verão azul

Apesar da instabilidade do tempo (e de muitas outras coisas) o Verão convida ao lazer, a momentos descontraídos, férias, regressos e reencontros, dias e noites sem fim. As novas tecnologias da informação, com destaque para as redes sociais, exibem fotografias de espaços e lugares e histórias de Verão. A partilha acontece com momentos bons e frescos, de festa, convívio e alegria! O pano de fundo é, na maioria dos casos, o mar...o mar azul da nossa bela costa e de muitas costas por esse mundo fora. O Verão é um tempo de pausa. É o descanso dos guerreiros. Em breve, a rotina dos dias tomará conta das nossas vidas, outra vez! A pausa do Verão convida também à reflexão e ao balanço. Convida ao pensamento e à lembrança de muitas coisas. Por isso, entre as memórias que vou desfiando, lembrei-me do "Verão Azul" e dei por mim a cantarolar o genérico dessa série extraordinária que a TVE estreou em 1981. Num momento em que Portugal e Espanha caminhavam na consolidação da democracia depois de tempos muito duros impostos pelas ditaduras ibéricas de Salazar e Franco, este momento de televisão constituiu um verdadeiro serviço público e uma "lufada" de ar fresco que a TVE ofereceu a Espanha e também aos territórios de Portugal que nas zonas de fronteira conseguiam captar o sinal, usufruindo de mais um canal televisivo. Já me referi muitas vezes à importância que a TVE na minha vida e na de muita gente, exactamente por ter constituído mais uma opção audiovisual, para além da RTP, num tempo de consolidação democrática em que a entrada em cena das televisões privadas era ainda uma miragem! A minha geração tinha um grande entusiasmo com esta série. Apesar do tempo de calor a hora do "Verão Azul" era sagrada! Lá estava tudo coladinho ao televisor à espera do genérico. Começava tudo a assobiar! O azul do mar da localidade de Nerja em território andaluz era o palco para as aventuras de um grupo fantástico constituído pelo pequenos Tito e Piraña, pelas inseparáveis Bea e Desi, os amigos Javi, Quique e Pancho García, acompanhados pela pintora Julia e pelo velho marinheiro Chanquete. Os seus episódios que foram visionados por mais de 20 milhões de espectadores romperam com uma televisão cinzenta e começaram, num tom fresco e leve, a abordar temas que nos interessavam muito como a adolescência, o namoro, o divórcio, o alcóol, drogas, as questões ambientais e os conflitos geracionais, entre outros. Na altura, também adolescentes, indentificavamo-nos com as vivências destas personagens do Verão Azul. Através da TVE também vivemos as aventuras de Verão, chorámos e rimo-nos com os protagonistas. Reflectimos sobre coisas que também se passavam connosco. Aprendemos. Contámos com uma boa ajuda para atravessarmos a nossa adolescência. Também chorei com a morte do Chanquete no penúltimo episódio! Mais uma vez estou grato à TVE por nos ter proporcionado estes momentos. Pouco tempo depois, dado o elevado interesse da série, a RTP exibiu-a em Portugal e fez muito bem. Voltámos a ver todos os episódios e a reviver cada uma das aventuras! Há momentos que nos marcam! Esta série marcou toda uma geração. A minha! A fronteira que ainda era uma linha separação começava a funcionar, através da TVE, como um espelho para podermos ver o que se passava do outro lado, em Espanha, e que afinal não era assim tão diferente do que se passava no nosso país. Entre cada episódio aprendemos novas palavras e, paulatinamente, a falar um "portuñol" que permitia manter uma conversa com os nosso vizinhos espanhóis. Também aí a TVE fez toda a diferença prestando, também nesse patamar, um verdadeiro serviço público. O Verão azul continuará até que apareçam os primeiros ventos do Norte e os sinais do regresso à rotina de sempre! Entretanto, ficam as memórias de sempre como este pedaço do mundo ibérico que povou e povoa o nosso imaginário. Entre os anos oitenta e actualidade o espaço da televisão mudou muito. Há uma multiplicidade de canais e ofertas para todos os gostos. Reconheço os esforços que muitas estações fazem para nos fornecerem tempos de serviço público apesar da asfixiante pressão comercial. Mas, por vezes, a quantidade não significa qualidade. Por isso, com os meios e condições que hoje existem, era bom que a televisão ganhasse maior responsabilidade social e carácter pedagógico introduzindo nas respectivas agendas mais programas com o significado e a importância do "verão azul" dos anos oitenta que a TVE e a RTP nos ofereceram! Os bons exemplos podem e devem ser copiados e adaptados aos tempos que vivemos. Todos ficaremos gratos se isso acontecer!